segunda-feira, 25 de julho de 2016

Jornalista vira motorista do Uber e ganha R$ 1,2 mil em três meses

No início, nem a família acreditava. Enviava ao nosso grupo do WhatsApp a tela do meu aplicativo e logo alguém reagia: "Como assim? Virou taxista de Uber?". E para explicar que, primeiro, não é taxista; segundo, é parceiro e dA Uber, assim, no feminino!?
De qualquer forma, quem não precisa de uma graninha a mais? Nunca pensei em deixar de ser jornalista, pelo contrário! Renderia boas histórias —a começar por este depoimento.
Fato é que, heavy user da Uber, comecei a ficar fascinado por seu universo da busca pela excelência ao unir via tecnologia motoristas e gente que quer ser transportada. O condutor não pode ter média inferior a 4,6; eu mesmo só dava quatro estrelas antes de saber disso, pois cinco teria de ter sido o auge dos bons serviços.
No meu caso, a maior motivação foi recomendação médica. "Uberar" seria terapêutico, uma forma de exercer de maneira menos compromissada algo de que gosto, que é dirigir e conversar com pessoas diferentes, mas sobretudo fugir de balada, álcool e remédio.
Ser Uber de responsa não requer um investimento astronômico, se a máxima de que "use o carro que está em sua garagem" for colocada em prática. Não foi o meu caso. Investi R$ 45 mil num Volkswagen Up! que serviria para a categoria X (a mais básica). A Audi topou emprestar um sedã A4 preto para viagens do tipo Black.
O Audi A4 impressionava. "Como ele investe num carro desses [coisa de mais de R$ 120 mil] para ser Uber?", parecia pensar o primeiro casal que peguei, ele americano, ela brasileira. Com frio na barriga, levei-os da Barra Funda à Vila Mariana. Contei ser a primeiríssima vez da minha "carreira". O raro cumprimento veio pelo aplicativo: "Perfect first ride" (primeira viagem perfeita).
É interessante como "virar Uber" o deixa mais disciplinado no trânsito, por uma razão muito simples: você está sendo observado e será avaliado. Portanto nada de avançar um pouco mais na faixa de pedestres, acelerar quando vê o amarelo ou teclar no celular nem mesmo nas paradinhas no sinal. É preciso ser "100% civilizado".
"O que é isto? Um parque de diversões?", perguntou a passageira ao constatar que no meu Uber ofereço Dadinho, iguaria cult servida até por Alex Atala no cafezinho do D.O.M. Os taxistas fitam o tempo todo o aplicativo da Uber na tela de seu smartphone. Uns fazem cara de poucos amigos. Outros ameaçaram, não a mim, mas a um colega: "Uber, né? Vocês vão ver só...", ao que o colega respondeu: "Todos têm de trabalhar, não é mesmo!?"
Depois do carro e do smartphone, itens mais caros (mas que muitos já têm), vêm despesas, digamos, mais burocráticas, como exame psicotécnico, segundo via da CNH, seguro para passageiro, suporte para celular, saco de balas, caixa com copos d'água e bolsa térmica. Investimento total: R$ 300,39.
Vale a pena? A resposta é: depende. É preciso ser estratégico, ir atrás dos grandes eventos (só um final de jogo no Allianz Parque, em um domingo, rendeu três boas corridas, uma delas para Santana de Parnaíba...). Vale também pelo tanto de gente com quem se conversa.
Explico: sou chamado a uma casa no Alto da Lapa. A senhorinha, de 80 anos, embarca. Parece, então, apertar o "play". Foi contando toda a luta do marido, que morreu há seis anos e convivera durante 11 com mal de Alzheimer. "Começamos estranhando quando ele entregou a chave do carro ao nosso filho. Logo ele, que era um excelente 'chauffeur'..."
Ao final da aventura, realizei 96 viagens, com pontuação média de 4,86 (a dos principais parceiros é 4,84). Total faturado: R$ 1.201,61. Dá pra fazer uma graninha... www1.folha.uol.com.br/saopaulo

4 comentários: