terça-feira, 15 de junho de 2021

Terceira onda de covid-19 deve acelerar mortes nas próximas semanas, alertam especialistas

 Na semana em que o Brasil se aproxima das 500 mil mortes por covid-19, epidemiologistas e cientistas de dados alertam para um novo agravamento da pandemia na maioria dos Estados e regiões do país.

Essa "terceira onda", expressão popularmente aceita para descrever o agravamento dos números após uma relativa melhora, está relacionada a diversos fatores — entre eles, o relaxamento das medidas restritivas, que permitiu o retorno de atividades sociais e comerciais e o consequente aumento da circulação de pessoas pelas ruas.

Mas há algumas características próprias do atual agravamento, como seu local de "início" e o as faixas etárias dos atingidos.

A preocupação é que essa retomada acontece num período em que os sistemas de saúde ainda estão bastante fragilizados e sem condições de dar vazão à chegada de milhares de novos pacientes.

"Estamos com uma transmissão comunitária do coronavírus extremamente alta e em patamares fora do controle. Para completar, temos cada vez menos intervenções para controlar isso", interpreta o médico Marcio Sommer Bittencourt, do Centro de Pesquisa Clínica e Epidemiológica do Hospital Universitário da USP.

"Diante disso, não tem como a nossa perspectiva ser positiva", diz.

De acordo com as projeções do Instituto de Métricas em Saúde da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, o Brasil pode contabilizar um total de 727 mil mortes por covid-19 até outubro de 2021.

Caso ocorra algum evento que piore ainda mais a situação da pandemia por aqui, esse número salta para 847 mil nas estimativas mais pessimistas feitas pelos especialistas americanos.

Mas, para entender o provável futuro da pandemia no país, é preciso antes saber como chegamos até aqui.

Três ondas ou tsunami?

Os especialistas são reticentes em afirmar que o Brasil viveu a primeira, a segunda ou a terceira onda da covid-19.

E é fácil entender a resistência a esses termos quando olhamos os gráficos de casos ou mortes relacionadas ao coronavírus: o país nunca chegou a reduzir de forma drástica os números das infecções ou dos óbitos.

Ao contrário de outros países, que têm picos muito bem definidos, a doença permaneceu relativamente estável por aqui durante muitas semanas de 2020 e 2021.

Mesmo nos períodos de maior calmaria, como os meses de outubro de 2020 e maio de 2021, a taxa de infectados e mortos nunca esteve realmente abaixo da casa das centenas ou até dos milhares.

Gráfico de mortes por covid-19 no Brasil

CRÉDITO,

DIVULGAÇÃO/OUR WORLD IN DATA

Legenda da foto,

Ao contrário do ocorreu em outros países, o número de mortes por covid-19 no Brasil nunca diminuiu pra valer e sempre se manteve em patamares elevados, mesmo nos momentos de maior calmaria

Vamos tomar o período mais recente como exemplo: fevereiro, março e abril de 2021 foram marcados por recordes diários nos boletins epidemiológicos. Até o momento, esse foi o período mais grave desde que a doença chegou ao país.

Em maio e no início de junho, os índices da covid-19 até diminuíram um pouco, mas na maioria das vezes eles se mantiveram acima das 2 mil mortes diárias.

Sequência de tragédias

"A pandemia possui uma sequência natural, que envolve a transmissão, a infecção, a hospitalização, a necessidade de UTI, a intubação e a morte", explica Bittencourt.

Tudo começa com indivíduos infectados que passeiam ou trabalham pelas ruas livremente e passam o coronavírus para aqueles que ainda estão suscetíveis. Isso vai criar novas cadeias de transmissão numa progressão geométrica.

Na sequência, cerca de 15% a 20% desse grupo apresentam sintomas mais preocupantes, que vão necessitar de uma atenção médica especializada.

Uma parte importante desses pacientes precisará ficar internada em enfermarias e UTIs. Alguns deles vão desenvolver complicações e morrer.

Agora, imagine o que acontece quando a taxa de transmissão do coronavírus está extremamente alta, como revelam as análises de Bastos: a consequência disso é a explosão dos números de hospitalizações nas semanas seguintes.

Foto de uma UTI no Rio de Janeiro

CRÉDITO,

ANADOLU AGENCY/GETTY IMAGES

Legenda da foto,

O aumento nas hospitalizações e mortes por covid-19 é apenas a ponta do iceberg que indica uma taxa de transmissão comunitária do coronavírus extremamente alta

E o problema fica ainda pior quando se considera que o número de leitos de enfermarias e UTIs é limitado, bem como a quantidade de médicos, equipamentos e insumos farmacêuticos.

Ou seja: não há vagas, recursos humanos ou material suficientes para suprir a demanda num momento de alta procura.

E essa falta de cuidados de saúde adequados desemboca em mais agravos: pessoas que poderiam se recuperar bem, caso recebessem a atenção necessária, simplesmente morrem em casa esperando por um leito.

O colapso no sistema de saúde, portanto, amplia a taxa de óbitos e torna essa avalanche da pandemia ainda mais dramática.

Foi isso que vivemos nos primeiros meses de 2021 e é algo que pode voltar a se repetir caso as medidas necessárias não sejam tomadas.

BBC BRASIL

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