Os cabelos. As sobrancelhas. A remada que parece fazer a canoa flutuar. O carrão com que circula pela cidade. Isaquias Queiroz é o espelho e a inspiração para crianças e jovens que acordam antes do sol nascer para remar no Rio das Contas, em Ubaitaba, pequenino município no interior da Bahia. Aqui, Neymar não tem vez. O sonho é ser como o filho da Dona Dilma. Na "Cidade das Canoas", o remo nas mãos faz as vezes da bola nos pés e empurra uma geração que a 1.300km de distância do Rio de Janeiro assistiu pela televisão a consagração do conterrâneo na Olimpíada.
Crianças e jovens de Ubaitaba sonham em ser o novo Isaquias (Foto: Thierry Gozzer)
A "Isaquiasmania" arrebata aos montes e lota a escolinha da Associação Cacaueira de Canoagem. Às margens do rio, crianças de oito anos carregam barcos três vezes maiores do que elas. As três medalhas olímpicas (duas pratas e um bronze), os títulos mundiais (júnior e adulto), tudo estimula a imaginação de pequenos que parecem perceber desde muito cedo que a canoagem talvez seja a única chance de um futuro melhor. Um futuro como o de Isaquias, que passou por cima de todas as dificuldades, inclusive as da própria escolinha, que carece de estrutura, e ganhou o mundo.
É o que busca Jonathan dos Santos, de 11 anos e com história de vida semelhante a do maior medalhista do Brasil em apenas uma edição de Jogos Olímpicos. Com pai e mãe desempregados, o garoto de 1,30m acorda cedo e vai remar. Muita das vezes com fome. Coloca a canoa sobre os ombros, atravessa a rua de paralelepípedos e desce as escadas até o Rio das Contas. Entre um treino e outro, o baiano precisa ajudar em casa. Assim como o ídolo quando criança, ele ganha uns trocados fazendo "carrego" na feira. Morando em um barraco de tábua e de terra batida, Jonathan leva caixotes de temperos e verduras e tudo que consegue é deixado para os pais.
Aos 11 anos, Jonathan é de família humilde e sonha em vencer através da canoagem (Foto: Thierry Gozzer)
- Quando eu vi o menino remando (o Isaquias), pedi minha mãe para remar. Fiz o teste, gostei, e estou me destacando. Ele foi minha motivação para remar. Ele é muito bom, é muito bom. Quero continuar, ter uma carreira, ser campeão como ele. Ser igual a ele. Minha mãe gostou de me ver remando, teve orgulho. A professora disse que se eu continuar, posso ser igual ao Isaquias, me deu mais vontade ainda de treinar - diz Jonathan, que está na terceira série e é o mais velho de seis irmãos, de um, três, cinco, oito e dez anos.
"CARRÃO" DE ISAQUIAS IMPRESSIONA
Isaquias é querido em Ubaitaba. Sempre que visita a cidade, faz questão de passar pela Associação Cacaueira de Canoagem. E quando passa por lá, deixa as crianças e jovens em êxtase. Chama atenção antes mesmo de colocar sua canoa no rio. Além do porte físico e da fama, até o carrão que circula pelas ruas impressiona os meninos. Mesmo crianças, eles percebem as ascensão social do conterrâneo e esperam ter futuro parecido.
Canoas cortam o Rio das Contas o dia inteiro com as crianças treinando (Foto: Thierry Gozzer)
O pequeno João Victor, de 11 anos, é outro que se inspira em Isaquias. Até nas sobrancelhas. Sua mãe faz faxina e o pai não é presente me sua criação. O avô serralheiro e a avó ajudam em casa. Remando há um ano, ele fica impressionado com a remada do ídolo e também com o carro dele.
- Não tem nada para fazer na rua, ficar pivetando é ruim. Quero crescer na vida e ser campeão mundial. Quero ser um campeão. Antes de remar eu ficava brincando na beira da rua, bagunçando, fazendo um bocado de coisa. Aqui é uma ocupação para mim. Eu sinto orgulho do Isaquias ser da cidade. Já vi ele uma vez, ele é forte, grande, tem um carrão. E quero um assim, quero ser igual ele - brincou João.
CABELO DE "SEM RIM" VIRA MODA
Aos 17 anos, Diego Fontes sabe que terá que "remar contra o tempo" para seguir os caminhos de Isaquias. Com apenas oito meses de canoagem, ele quer chegar à seleção brasileira. O caminho não é fácil e cheio de concorrentes. Ainda cursando a quinta série, ele tem a mãe doméstica e o pai eletricista. Forte, ele mora na mesma rua em que o medalhista olímpico cresceu e enquanto não consegue seus objetivos, ao menos no cabelo é igual ao herói.
- Quando ele foi campeão do mundo, mostrou que pode. O sonho de todos nós é ser campeão e medalhista olímpico como ele. Tenho vontade, tenho força. E sonho sempre. Eu tenho condições de trilhar o caminho dele. É só ter força de vontade e não parar. Dizem que me pareço com ele (risos). Eu comecei a cortar o cabelo do modo que ele corta. Ele me inspira até no corte de cabelo - explica Diego.
- Quando ele foi campeão do mundo, mostrou que pode. O sonho de todos nós é ser campeão e medalhista olímpico como ele. Tenho vontade, tenho força. E sonho sempre. Eu tenho condições de trilhar o caminho dele. É só ter força de vontade e não parar. Dizem que me pareço com ele (risos). Eu comecei a cortar o cabelo do modo que ele corta. Ele me inspira até no corte de cabelo - explica Diego.
Corte de cabelo de Diego também é inspirado em Isaquias (Foto: Thierry Gozzer)
Os feitos do menino de Ubaitaba não impressionam apenas os meninos mais pobres. Filho de uma vereadora da cidade, Lucas Raique Carneiro, de 12 anos, rema há dois e espera ter a chance de alçar os mesmos voos que Isaquias.
- Comecei a remar depois que vi o Isaquias. A remada dele é perfeita. É bonita. No dia que vi ele aqui, entrei na canoagem logo, falei "Mainha, me coloca na canoagem logo". Quero ser igual a ele, não vou parar não. Ele remando me chamou muita atenção, parece que o barco flutua - diz o menino, que rema três vezes por semana e faz 20 tiros de mil metros por treino e depois vai para a escola no período vespertino.
PROFESSORA VÊ OUTROS ISAQUIAS NO FUTURO
Meninos se inspiram em Isaquias Queiroz em Ubaitaba (Foto: Thierry Gozzer)
Quem comanda a escolinha e preside a Associação Cacaueira de Canoagem há seis anos é Camila Lima, de 30 anos. Ex-canoísta, ela identifica os talentos e dá as aulas nos períodos da manhã e da tarde. Com as medalhas de Isaquias na Olimpíada, ela acredita que a procura pelas aulas, que já é grande, vão no mínimo dobrar. Camila garante que Ubaitaba tem fôlego para revelar outros ídolos nacionais e medalhistas olímpicos.
- Não tenho dúvidas. Com essas medalhas, vai chover meninos. Agora, todo mundo quer ser um Isaquias. Se vierem 200 crianças, temos condições de atender. Passou disso, não temos mais condições. O Jonhatan, por exemplo, rema com a gente há nove meses, classificou para o campeonato brasileiro, que é em Curitiba, e acredito muito nele. Acredito que ele vai ser campeão brasileiro. Ele tem apenas 11 anos e se ele continuar no ritmo que está, vai ser um grande nome. Está muito bem. Tenho meninos que tem dois anos remando e não chegam no Jonathan hoje - conta Camila, falando sobre o pequeno da história semelhante a Isaquias e cheio de talento também.
- Não tenho dúvidas. Com essas medalhas, vai chover meninos. Agora, todo mundo quer ser um Isaquias. Se vierem 200 crianças, temos condições de atender. Passou disso, não temos mais condições. O Jonhatan, por exemplo, rema com a gente há nove meses, classificou para o campeonato brasileiro, que é em Curitiba, e acredito muito nele. Acredito que ele vai ser campeão brasileiro. Ele tem apenas 11 anos e se ele continuar no ritmo que está, vai ser um grande nome. Está muito bem. Tenho meninos que tem dois anos remando e não chegam no Jonathan hoje - conta Camila, falando sobre o pequeno da história semelhante a Isaquias e cheio de talento também.
Canoa tem o triplo do tamanho das crianças (Foto: Thierry Gozzer)
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